Perante um mundo super-estimulado como nunca o foi na sua história,
os pais ficam ultrapassados com as exigências das crianças e dos jovens. Quem é que não fica confuso perante uma
criança agitada, hiperativa, exigente, “alérgica” à frustração que impõe os
seus desejos com uma imposição impressionantemente desconcertante?
Esta evolução da sociedade
implica um apoio necessário aos pais para obterem as “ferramentas” necessárias
para guiar e conter as crianças e os jovens, para não baixarem os braços ou
incutirem maltratos psicológicos desnecessários. Certos pais interpretam estas atitudes dos filhos como se fossem uma
autonomia. Na verdade, assemelha-se mais a uma vontade irresistível de
dominar tudo e todos, destabilizando o desenvolvimento psíquico e relacional
saudável da criança e do jovem. Por outro lado, outros pais preocupam-se, esgotam-se e culpabilizam-se, o que
também não é favorável para ninguém. Donde
vêm estas formas de lidar diferentes por parte dos pais?
É preciso notar que muitos pais
não querem repetir as injunções, as obrigações, o autoritarismo da geração
anterior que eles próprios viveram enquanto criança. Também é verdade que não é
necessário repetir isso. Em nome do amor ou do respeito pela criança tentam
atenuar o que interpretam como um sofrimento na criança. Querem ser um bom
amigo dela e tentam racionalizá-la. Esperam que a criança entenda e aprove com
um sorriso. Só que esta lógica do discurso, de procura de empatia, é pouco
eficaz. Pensa-se que porque sou o teu amigo é normal que haja reciprocidade.
Que ajas comigo da mesma forma. Porém, a criança ainda não desenvolveu
suficientemente as estruturas mentais para tal. Explicar-lhe racionalmente as coisas ou tentar entrar em relacionamento
de amizade com ela não é pertinente, porque a criança, também debaixo da
influência da emoção, não ouve nada nem tem acesso à lógica. Este
procedimento, com boas intenções, incute
na criança a desvalorização da autoridade paternal. O que pode originar
surpreendentemente um futuro jovem que sabe amar e consciente deste valor, com
uma aceitável autoestima, mas com uma fraca autoconfiança que o conduz a ter
muitas dificuldades em enfrentar os obstáculos da vida.
Gerir a frustração aprende-se tal como o andar, o falar, a leitura e a
escrita. A criança precisa de ser guiada e rodeada de adultos preparados para
que isso aconteça. É uma prova já bastante difícil para a criança e não
vale a pena acrescentar-lhe gritos, brutalidade, humilhações ou castigos.
Cai-se no outro extremo, o do sofrimento, que leva a um futuro jovem adulto
ressentido, vingativo, egocêntrico ou amargo perante a vida.
Qualquer adulto pode perder as
estribeiras perante uma crise insuportável duma criança ou dum jovem, inclinado
para a violência física ou psicológica. A
criança tem a capacidade de tolerar um limite, de ouvir um “não” que
desencadeia a frustração nela. Mas quando ela suporta mais daquilo que é
necessário, que vai além da sua capacidade de suportar, aí sim está-se a suscitar
sofrimento nela. Nestas condições, será conveniente afastar-se mais da
criança/jovem e deixar esta tarefa para um outro adulto, próximo da criança,
melhor preparado ou pedir apoio para conseguir da melhor forma ajudar a criança
ou o jovem a desenvolver a capacidade de gestão da frustração.
De qualquer forma, mimar, amar,
estimular, desejar o melhor e proteger a criança é algo natural, mas quando se idólatra
a criança, quando ela vive num contexto
onde tudo é orientado para ela sem se lhe fazer entender a realidade, quando o
seu bem-estar é sempre mais importante que os sentimentos dos outros,
participa-se numa construção de poder na criança dificilmente controlável.
Este futuro adulto vai encarar o mundo apenas como um meio para satisfazer o
seu prazer. Vai desenvolver atitudes
cada vez mais patológicas (que pode ir de uma ira irracional a uma angústia
perante qualquer adversidade), de
tirania e de sufocação emocional sobre os outros. Tornam-se indivíduos com tendência a ocuparem postos ou posições de
poder.
A frustração é uma emoção que, popular e erradamente, se compara como
se fosse um sofrimento. É, de facto, desagradável e, ao mesmo tempo, fundamental para se conseguir projetar no
futuro, para se não ficar preso na procura do prazer imediato. Logo que
esse prazer seja desfrutado segue-se a insatisfação. Entra-se num ciclo de
interna insatisfação. Dificilmente, se desenvolvem as estruturas mentais necessárias
para o sentimento de gratidão, de querer retribuir ao outro o seu bem-estar
numa sociedade saudável.